30/04/2017

O STF e suas contradições


O assunto é espinhoso, mas faz tempo que pretendia escrever algo sobre o exacerbado protagonismo do judiciário e suas incoerências que geram uma insegurança jurídica sem precedentes na história do Brasil.

É fato que os poderes legislativo e executivo, onde os representantes são eleitos pelo voto popular, vêm perdendo, a cada dia que passa, os espaços que lhes são atribuídos pela Constituição Federal. Contudo, o vácuo deixado pelos agentes políticos é, automática e perigosamente, ocupado pelo poder judiciário. Mas a judicialização da política e de tudo mais que a fértil imaginação humana possa imaginar fazem com que a sociedade se depare com decisões judiciais que, ao invés de proporcionar a pacificação dos conflitos, desencadeiam verdadeiro tsunami de instabilidade jurídica.

Não é de hoje que se verifica uma verdadeira e permanente invasão de competência do poder judiciário em atividades típicas dos poderes legislativo e executivo, promovendo o enfraquecimento destes e um empoderamento preocupante daquele.

A independência e o fortalecimento conjunto dos poderes não só são importantes como são fundamentais para que não tenhamos uma ditadura dissimulada de um desses mesmos poderes.

Em relação a nossa Suprema Corte, esta deixou de ser um tribunal constitucional e já investiu tempo e dinheiro público para julgar caso de furto de galinha. Inacreditável.

Mas foi uma decisão recente que me fez escrever algo sobre nosso Supremo. O fato inusitado ocorreu no caso do goleiro Bruno, ex-Flamengo.

Argumentos do ministro Marco Aurélio no caso do goleiro Bruno

Farei a abordagem do caso do goleiro Bruno partindo do princípio que o amigo leitor conhece o assunto. Porém, caso não conheça, basta clicar aqui.

No último dia 21 de fevereiro, o ministro Marco Aurélio, do STF, deferiu liminar pleiteada em Habeas Corpus e determinou a expedição de alvará para liberar o goleiro Bruno da prisão. Até esse momento, não havia nada de sobrenatural na decisão, mas o que me chamou atenção foram os fundamentos do ministro na concessão da liminar, pois defendeu que a opinião pública não pode ser fundamento para permitir que alguém permaneça preso por tempo indeterminado, e o fez nos seguintes termos: “o clamor social surge como elemento neutro, insuficiente a respaldar a preventiva”. Abaixo, trecho da liminar que liberou o goleiro Bruno da prisão:









Após a decisão, em 25 de abril, a Primeira Turma do STF derrubou, por 3 votos a 1, a liminar concedida pelo ministro Marco Aurélio. Votaram a favor da volta de Bruno à prisão os ministros Alexandre de Moraes, Rosa Weber e Luiz Fux. O único voto contrário foi do próprio ministro Marco Aurélio, que havia concedido a liminar em HC para liberar o goleiro.

Na sessão de julgamento da Primeira Turma do STF, que decidiu pelo retorno de Bruno à prisão, o ministro Marco Aurélio, ao defender sua posição, argumentou que:


“Não podemos julgar a partir do clamor social. Hoje, se fizermos uma pesquisa, vamos ver que a sociedade está indignada com a corrupção que assola o Brasil. Ela quer vísceras e sangue, e não o devido processo legal. O paciente é primário e possui bons antecedentes. Não tinha na folha penal nada que maculasse o seu perfil. Nada justifica, nada absolutamente, uma prisão processual enquanto não houver condenação transitada em julgado a durar seis anos e sete meses.”


Não farei nenhuma abordagem técnica sobre o caso do goleiro Bruno, darei ênfase apenas à postura do ministro Marco Aurélio e os seus fundamentos para liberar o goleiro, qual seja: que o apelo popular não pode servir como fundamento para que alguém seja ou permaneça preso. Em outras palavras, como bem disse o ministro: “a sociedade quer vísceras e sangue, e não o devido processo legal".  

Argumentos do ministro Marco Aurélio no caso Mensalão

Para melhor avaliar a postura e contradição do ministro Marco Aurélio, e do próprio STF, é preciso voltar ao passado. O vídeo abaixo é referente ao famoso caso do “mensalão” (AP 470) onde o mesmo ministro Marco Aurélio debate com vigor com o também ministro do STF, Luís Barroso, quando este ainda era “novato” na Suprema Corte, e, nesse julgamento, Marco Aurélio defende uma argumentação completamente contraditória em relação àquela que defendeu para libertar Bruno. Mais ainda, quando o ministro Luís Barroso defendeu a tese segundo a qual a indignação popular jamais pode servir como base para que ele, enquanto ministro, julgue um caso, o ministro Marco Aurélio desceu o nível do debate, chamou Barroso de novato e disse que ele devia, sim, “satisfação” aos contribuintes e que a opinião da sociedade era levada em consideração para tomar suas decisões.

Vamos ao vídeo da AP 470:



Da contradição dos argumentos do ministro Marco Aurélio

É óbvio que um ministro do STF, enquanto servidor público e pelo tamanho da responsabilidade que possui em mãos (onde suas decisões podem afetar dezenas, centenas, milhares e quiçá milhões de brasileiros), deve satisfação aos contribuintes, mas jamais este ministro poderá para tomar suas decisões sob a influência da opinião pública, no intuito de se ter uma manchete favorável nos grandes veículos de comunicação.

Percebam que os argumentos do nobre ministro Marco Aurélio, no julgamento do mensalão (vídeo), são completamente diferentes daqueles que ele utilizou para liberar o goleiro Bruno. No vídeo, Aurélio critica Barroso por este assegurar o devido processo legal ao réu, independentemente da repercussão de sua decisão perante a opinião pública, ironizando o colega por não ouvir as vozes da rua. Contudo, no caso do goleiro Bruno, Aurélio defende a mesma tese do ministro Barroso, num supremo contrassenso.

O que se pretende ressaltar com presente postagem é o estado de insegurança jurídica que vivemos. Decisões completamente fora do compasso, perante nossa Corte Suprema, são corriqueiras. A sociedade inteira paga um preço altíssimo pela falta de clareza das decisões, não apenas dos tribunais superiores, mas especialmente deles.

Entre a lei e sua aplicação existe o homem. E o homem é um ser cheio de peculiaridades.

Por certo, nosso Supremo é um tribunal composto por magistrados experientes e estes bem sabem que quando suas decisões judiciais e políticas extrapolam os limites da razoabilidade colocam em risco toda a estabilidade de nossa Democracia, pois para toda ação existe uma reação.

Esperamos que, em se confirmando o fim do foro por prerrogativa de função (foro privilegiado), o STF se torne, verdadeiramente, uma corte constitucional e as suas decisões possam trazer a estabilidade e segurança jurídica que todos nós esperamos.

22/04/2017

Advocacia: muito mais que uma profissão, uma paixão


É com imensa tristeza que leio a entrevista do presidente estadual da Ordem dos Advogados do Brasil, Seção Pará (OAB-PA), Alberto Campos, concedida ao site Jota. O presidente Alberto Campos informa que, durante as cerimônias de entrega de carteira, costuma perguntar aos novos advogados se pretendem seguir a advocacia e, pasmem, somente 3 (três) em cada 10 (dez) dizem que sim. A maioria externa a intenção de prestar concurso público.

Certamente, advogar não é para qualquer um. É preciso muito mais que vontade para seguir esta que é uma das mais belas e dignas carreiras.

Da partidarização da OAB e sua consequência nefasta para a Advocacia

Não é de hoje que identificamos a partidarização da OAB. Os grupos que se digladiam pelo poder da Ordem o fazem sabendo que estão implodindo o protagonismo que a OAB pode ter perante a sociedade. Infelizmente, os interesses individuais sempre falam mais alto do que o fortalecimento da classe.

Mais triste do que ver a guerra de foice entre os grupos oposicionistas que pretendem comandar a OAB, é ver parte dos demais colegas advogados que se deixam levar por discursos demagogos, como massas de manobras. Somos uma classe politizada por natureza. Não há justificativa para permitirmos ser manipulados por outros colegas igualmente politizados. Essa luta cega pelo poder só faz enfraquecer a Advocacia e todos nós temos culpa nesse processo de fragmentação da Ordem.

É preciso repensar nosso modo de atuação e colocar os interesses coletivos acima dos individuais. A sociedade agradece.

Advogar é uma arte

Advogar é uma arte e requer dedicação típica de um artesão que se dedica de modo especial à peça encomendada pelo cliente para que esta tenha o seu toque de exclusividade. Cada ação precisa ter a atenção especial do advogado, pois o cliente espera que a mesma seja tratada como se fosse a única do escritório.

Sobre a constatação do presidente Alberto Campos, um dos fundamentos mais presentes no discurso de quem pretende prestar concurso público é a tão sonhada estabilidade financeira. Perfeitamente compreensível.

Na advocacia, é importante destacar, o fato de ter conseguido a carteira da Ordem não significa que ao final do mês milhares de honorários irão cair na conta bancária do profissional pelo simples fato de ser advogado. Não mesmo.

O caminho entre o recebimento da carteira da OAB e a estabilidade financeira almejada por qualquer advogado é árduo e requer tempo de amadurecimento. Afinal, abrir um escritório, por si só, não é sinônimo de sucesso garantido. Existem vários fatores, internos e externos, que são levados em consideração para o êxito ou não do escritório.

Ocorre, porém, que todas essas questões fazem parte da seleção natural de toda e qualquer profissão e isso faz bem a sociedade, pois, por exemplo, aquele que não se qualifica permanentemente e permite que seu cliente fique vulnerável por negligência própria não é digno de ser chamado de profissional.

Advocacia nossa de cada dia

Só quem já teve a experiência de trabalhar arduamente para buscar o direito de um cidadão (cliente), passando por cima de todos os obstáculos que essa tarefa nos impõe, é que sabe o quão gratificante é ver o resultado final do trabalho. É algo inexplicável. Não há dinheiro que consiga pagar a satisfação do dever cumprido.

Definitivamente, não é fácil explicar ao cliente que determinada demora no andamento processual não é culpa do advogado, que o advogado não pode garantir uma sentença favorável ao pleito do cliente, mas tão somente que se dedicará a fazer o melhor trabalho possível para alcançar o objetivo almejado.

Definitivamente, não é fácil ser ignorado e/ou mal atendido por alguns em determinadas repartições como se estivessem fazendo um “favor” ao advogado, quando este precisa de informações necessárias para lutar pelo direito de seus clientes.

Definitivamente, não é fácil obter uma decisão judicial completamente fora da realidade dos autos e ter que explicar aquela anomalia ao cliente e familiares.

Definitivamente, não é fácil tentar acessar o sistema de peticionamento e identificar que ele está “fora do ar”.

Definitivamente, não é fácil explicar ao cliente que o advogado não pode perder prazos processuais, mas o juízo e o Ministério Público podem, pois, para eles, o prazo é impróprio.

O advogado é indispensável à administração da justiça, nos termos do art. 133 da Constituição Federal, e é preciso que todos saibam e respeitem tais ensinamentos constitucionais, pois quando um advogado é desrespeitado no exercício da função não é a pessoa física do advogado que foi agredida, mas toda a sociedade.

Por certo, aquele que agride as prerrogativas do advogado o faz sem perceber que a qualquer momento pode precisar de um causídico para defender seus interesses e quando precisar, fatalmente, irá desejar que seu advogado possa atuar na plenitude de suas prerrogativas, pois, assim, conseguirá buscar de forma mais efetiva o direito que pretende demonstrar perante a quem de direito.

Contudo, mesmo com todas as agruras, a Advocacia é apaixonante e o seu exercício é inexplicavelmente mágico e quem a exerce deve, obrigatoriamente, fazer por vocação, não por passa tempo.


Para finalizar, quero deixar registrado que se dez vidas tivesse, em onze eu escolheria ser Advogado.

03/04/2017

Cassação da chapa Dilma-Temer: TSE inicia terça feira (4) o julgamento da AIJE 194358



Durante três dias desta semana, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) realizará quatro sessões exclusivas para o exame da Ação de Investigação Judicial Eleitoral nº 194358, protocolada pelo Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB) contra a chapa vencedora das Eleições 2014, Dilma-Temer.

Como sabemos, Dilma Rousseff não mais ocupa o cargo de presidente da República, pois foi afastada definitivamente após um processo de impeachment. Contudo, na sessão que definiu sua saída do cargo, os senadores, sob a presidência do ministro presidente do Supremo Tribunal Federal, Ricardo Lewandowski, votaram pela manutenção dos direitos políticos da agora ex-presidente.

Após o afastamento definitivo de Dilma, o então vice-presidente, Michel Temer, assumiu o cargo de presidente da República. Paralelamente, a AIJE protocolada pelo PSDB, após o fim das Eleições 2014, contra a chapa PT/PMDB, continuava sua tramitação perante o TSE quando, na última semana, o presidente da Corte Eleitoral, ministro Gilmar Mendes, marcou o julgamento para esta semana, após a conclusão dos trabalhos pelo relator da ação, ministro Herman Benjamin.

Especula-se que, tendo em vista a complexidade do caso e o tamanho dos autos, pode ocorrer algum pedido de vista pelos ministros do TSE, justamente para melhor análise dos detalhes da ação. Assim sendo, caso ocorra tal pedido, o desfecho final da ação ficará para outra data.

Aliás, convenhamos, caso haja algum pedido de vista, o mesmo será perfeitamente compreensível, pois não é todo ano que o TSE possui uma ação de tal envergadura com possibilidade real de cassar uma chapa presidencial que saiu vitoriosa das urnas. Assim sendo, os ministros que participarão do julgamento precisam ter conhecimento dos detalhes da ação para que tenham a segurança necessária para decidir seu voto.

A única certeza por enquanto é que a semana será recheada de grandes emoções nos corredores de Brasília.