Em 16/05/2016, publiquei aqui no blog
a seguinte postagem: “Da
diminuição do período eleitoral e da maior flexibilidade da divulgação da
pré-candidatura”. No texto, relatei que a Lei 13.165/2015 alterou a Lei das
Eleições (Lei 9.504/1997) e trouxe algumas mudanças sensatas, como a maior
flexibilidade do pré-candidato a cargo eletivo exaltar suas qualidades
pessoais, fazer menção a sua pretensa candidatura, bem como exposição de plataformas
e projetos políticos, sem que isso caracterizasse propaganda antecipada, desde
que não haja pedido expresso de voto, nos termos do artigo 36-A.
O primeiro teste para a aplicação das
novas regras eleitorais se deu nas Eleições 2016 e a Justiça Eleitoral deu fiel
cumprimento ao texto legal, indeferindo diversas representações por propaganda
eleitoral antecipada e consolidou o entendimento de que, para se caracterizar a
propaganda extemporânea, havia necessidade de pedido expresso de voto. Para
exemplificar, veja abaixo o texto do artigo 36-A, da LE, e a ementa da
representação nº 4346, oriunda de Itabaiana – SE, e julgado improcedente (negado
provimento) pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE):
________________________________________________________
Lei
9.504/1997:
(...)
Art. 36-A. Não configuram propaganda eleitoral antecipada, desde que não envolvam pedido explícito de
voto, a menção à pretensa candidatura, a exaltação das qualidades pessoais
dos pré-candidatos e os seguintes atos, que poderão ter cobertura dos meios de comunicação
social, inclusive via Internet:
(...)
I
– a participação de filiados a partidos políticos ou de pré-candidatos em
entrevistas, programas, encontros ou debates no rádio, na televisão e na Internet,
inclusive com a exposição de plataformas e projetos políticos, observado pelas
emissoras de rádio e de televisão o dever de conferir tratamento isonômico;
___________________________________________________________________
___________________________________________________________________
RESPE
- Agravo Regimental em Recurso Especial Eleitoral nº 4346 - ITABAIANA – SE
Ementa:
AGRAVO
REGIMENTAL. RECURSO ESPECIAL. ELEIÇÕES
2016. REPRESENTAÇÃO. PROPAGANDA
ELEITORAL EXTEMPORÂNEA. ÁUDIO. DIVULGAÇÃO POR CARRO DE SOM, REDES SOCIAIS E
MENSAGENS VIA WHATSAPP. PEDIDO DE VOTO. AUSÊNCIA. ART. 36-A DA LEI 9.504/97.
PRECEDENTES. DESPROVIMENTO.
1.
Propaganda extemporânea caracteriza-se
apenas na hipótese de pedido explícito de voto, nos termos do art. 36-A da Lei
9.504/97 e de precedentes desta Corte.
2.
Extrai-se da moldura fática do aresto do TRE/SE que os recorridos limitaram-se
a divulgar áudio - por meio de carro de som, redes sociais e mensagens via
WhatsApp - com o seguinte teor: "[...] seu irmão vai ser prefeito e você
nosso deputado, Luciano meu amigo, Itabaiana está contigo e Deus está do nosso
lado [...]" (fl. 67v).
3.
Agravo regimental desprovido.
Decisão:
O Tribunal, por maioria, negou provimento
ao agravo regimental, nos termos do voto do Relator.
________________________________________________________
Percebam que o “item 1” da decisão
ressalta que a propaganda extemporânea caracteriza-se apenas na hipótese de pedido
explícito de voto, conforme consta do artigo 36-A, da Lei 9.504/1997, motivo
pelo qual o TSE não aplicou a multa aos
pré-candidatos. A decisão reforçou, ainda, que tal posicionamento da Corte se
deu também pelos seus próprios precedentes. Em outras palavras, o pedido
explícito de votos para caracterizar a propaganda antecipada era fundamental,
no entendimento do próprio TSE.
No caso concreto da decisão
mencionada acima, os pré-candidatos, segundo trecho do acórdão do TRE-SE: “limitaram-se a divulgar áudio - por meio
de carro de som, redes sociais e mensagens via WhatsApp - com o seguinte teor:
"[...] seu irmão vai ser prefeito e
você nosso deputado, Luciano meu amigo, Itabaiana está contigo e Deus está do
nosso lado [...]”
Pois bem, seguindo a atual “tendência jurisprudencial brasileira”,
onde o que estava pacificado ontem pode não estar mais hoje, o TSE vem
paulatinamente praticando o que o próprio Tribunal denomina de “evolução jurisprudencial” e a festejada
flexibilidade da pré-campanha pode estar com os dias contados.
Ora, o texto do artigo 36-A, da LE,
ao proibir apenas o pedido explícito de voto nas manifestações dos
pré-candidatos, por óbvio, permite que outras formas de pedido de apoio possam
ser empregadas pelos agentes políticos. Afinal, pedir o “apoio” de alguém após expor sua plataforma política numa
entrevista, por exemplo, está sim dentro do conceito almejado pelo legislador
quando da alteração do referido artigo. Não se pode pedir expressamente o voto
pelo simples fato de ainda não existir a candidatura, pois ainda está se
falando de pré-candidatura, de período pré-eleitoral, que antecede o registro
oficial da candidatura perante a Justiça Eleitoral. Assim sendo, havendo o pedido
expresso de voto, estará caracterizada a propaganda extemporânea e a multa
correspondente deverá ser aplicada.
Da “(in) evolução jurisprudencial”
Em 09/07/2016, publiquei a seguinte
postagem http://www.claudiomoraes.adv.br/2016/07/eleicoes-2016-da-flexibilizacao-da-pre.html,
onde argumentei que:
________________________________________________________
“Político faz política todo instante. O que tínhamos antes da última alteração
da legislação eleitoral era uma verdadeira incoerência do legislador, que
também era atingido pelas insensatas amarras legais. Não havia lógica tentar
“esconder” o pré-candidato do eleitorado. Vivia-se um verdadeiro faz de conta.
Os pré-candidatos pareciam andar nas sombras para não serem “apanhados”.
Teoricamente,
quem deseja ser aprovado em convenção partidária para disputar um cargo eletivo
precisa, anteriormente, ter realizado algum tipo de trabalho que possa levar ao
eleitorado a ideia que essa pessoa é uma boa opção no momento do voto. Não dá
para transformar uma pessoa comum em um pretenso candidato somente no dia da
convenção, essa pessoa precisa ter uma história de trabalho que a credencie ser
representante do povo.”
___________________________________________________________________
A postagem
tratou de evidenciar os benefícios que a flexibilização da pré-campanha pode
trazer ao processo eleitoral como um todo, especialmente pelo fato da
diminuição do período de campanha, que foi reduzido de 90 para 45 dias.
Ocorre
que essa flexibilidade, estabelecida em lei, agora pode começar a ter novos
rumos, pois o Colendo TSE, em 01/03/2018, considerou propaganda antecipada uma
expressão utilizada por determinado pré-candidato, que não pediu expressamente
o voto, como determina o mencionado artigo 36-A, da LE, e própria jurisprudência
até então consolidada pela Justiça Eleitoral.
Conforme
trecho do acórdão do TRE-CE, que julgou improcedente a representação do Ministério
Público Eleitoral, seguindo o entendimento até então consolidado pelo TSE:
_________________________________________________________________
“determinado pré-candidato ao
cargo de prefeito, anteriormente ao início do período de propaganda eleitoral,
concedeu entrevista a um veículo de comunicação, oportunidade em que proferiu o
seguinte discurso: “Eu vou ter muita
honra de ser prefeito da cidade, se Deus permitir e o povo; a única coisa que
eu peço ao povo é o seguinte: ter esta oportunidade de gerir”. (Agravo
Regimental no Recurso Especial Eleitoral nº 10-87, Aracati/CE, rel. Min. Jorge
Mussi, julgado em 1º.3.2018.)
_________________________________________________________________
O Plenário do Tribunal Superior
Eleitoral, por unanimidade, entendeu que no caso concreto ficou caracterizado
pedido explícito de voto e, por conseguinte, propaganda antecipada e aplicou a respectiva
multa.
Quis o
legislador que somente os pedidos expressos de votos seriam tidos como
propaganda antecipada, logo, as demais manifestações de um pré-candidato
estariam dentro da margem de atuação de uma pré-campanha.
Agora,
o TSE, debruçando-se sobre a tal “evolução
jurisprudencial”, tenta dar novos contornos ao artigo 36-A, da LE, e
sinaliza voltar no tempo e endurecer novamente a pré-campanha, alterando os
rumos que o legislador, legitimamente eleito pelo voto popular, imprimiu ao
dispositivo.
É
impensável que o Poder Judiciário, ou mesmo o Legislativo, possa enumerar todas
as formas como um pré-candidato pode se manifestar sem que esteja caracterizado
como propaganda antecipada, motivo pelo qual o legislador optou por proibir
apenas o pedido expresso de voto, o que, contrário senso, permite todas as
outras formas.
Contudo,
no TSE, iniciados os debates para uma possível mudança jurisprudencial, alguns
membros da Corte querem consolidar um argumento segundo o qual o pré-candidato estaria incorrendo em
propaganda antecipada quando, mesmo sem pedir expressamente o voto, “promover o pedido explícito contextualizado,
e não o verbalizado”. Seja lá o que isso signifique.
Vejamos as duas decisões para fazermos uma análise mais detalhada da diferença
das manifestações dos pré-candidatos, lembrando que em nenhum das duas
representações houve pedido expresso de voto:
“limitaram-se a divulgar áudio - por meio de carro de som, redes sociais
e mensagens via WhatsApp - com o seguinte teor: "[...] seu irmão vai ser prefeito e você nosso deputado, Luciano
meu amigo, Itabaiana está contigo e Deus está do nosso lado [...]”
(RESPE - Agravo
Regimental em Recurso Especial Eleitoral nº 4346 - ITABAIANA – SE.)
(Neste caso, não houve aplicação de multa eleitoral)
“determinado pré-candidato ao cargo
de prefeito, anteriormente ao início do período de propaganda eleitoral, concedeu
entrevista a um veículo de comunicação, oportunidade em que proferiu o seguinte
discurso: “Eu vou ter muita honra de
ser prefeito da cidade, se Deus permitir e o povo; a única coisa que eu peço ao
povo é o seguinte: ter esta oportunidade de gerir”.
(Agravo Regimental
no Recurso Especial Eleitoral nº 10-87, Aracati/CE, rel. Min. Jorge Mussi, julgado
em 1º.3.2018).
(Neste caso, houve aplicação de multa eleitoral)
Vejam que
em ambas as decisões, mesmo não havendo pedido expresso de voto, as manifestações
dos pré-candidatos assemelham-se. É exatamente neste ponto que a dúvida recai:
como a Justiça Eleitoral pretende medir ou estabelecer limites às narrativas
dos pré-candidatos, lembrando que a própria lei assim já procedeu, proibindo unicamente o
pedido expresso do voto?
Definitivamente,
uma Corte Superior Eleitoral que muda sua “jurisprudência consolidada” de uma
eleição para a outra não colabora com a estabilidade político-eleitoral que tanto
precisamos.
A seguir,
o vídeo da sessão plenária do TSE, de 01/03/2018, onde ocorreu o julgamento do Agravo Regimental no Recurso Especial
Eleitoral nº 10-87, Aracati/CE, rel. Min. Jorge Mussi, (julgamento ocorre aos 1:23:13),
a saber:
